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Categoria: Cartéis
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Ação que corre em São Bernardo do Campo-SP, sob segredo de Justiça, denuncia 11 executivos de transportadoras, ex-presidente do sindicam e da ANTV. Todos por formação de cartel e de quadrilha

Depois de aceitar a denúncia oferecida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a juíza Patrícia Svartman Poyares Ribeiro, da quinta vara criminal da comarca de São Bernardo do Campo, determinou segredo de Justiça à ação penal movida contra 11 executivos de grandes transportadoras de veículos do país, mais o ex-presidente do Sindicam, Aliberto Alves (já condenado em primeira instância por crime de formação de cartel pela Justiça Federal do Rio Grande do Sul), e um diretor da Associação Nacional das Empresas Transportadoras de Veículos (ANTV), Luiz Salvador Ferrari.

A acusação é de formação de cartel no setor de transporte de veículos zero quilômetro (artigo quarto, I, da lei 8.137/90) e de quadrilha ou bando (artigo 288 do código penal). O segredo de Justiça foi decretado em 6 de setembro do ano passado. Na decisão, a magistrada esclarece: “determino que os autos tramitem em segredo de justiça, arquivando em pasta própria, sob responsabilidade do Escrivão, os documentos ora desentranhados". Da determinação, a Promotoria tomou ciência em 3 de outubro. Agora, segundo apurou o site Anticartel, a magistrada fará audiência no próximo mês para a oitiva dos réus.

A denúncia oferecida pelo Gaeco foi assinada pelos promotores especializados Lafaiete Ramos Pires e Mylene Comploier, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – Núcleo de Atuação Regionalizada de São Paulo – Subnúcleo Grande São Paulo I – ABC. A peça da denúncia foi conseguida pelo site Anticartel com exclusividade.

De acordo com a denúncia, “de forma habitual e em contexto de ação de organização criminosa, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, associaram-se em quadrilha, de modo estável e permanente, com a finalidade precípua de cometer diversos crimes contra a ordem econômica descritos a seguir”.

“Consta, também, entre data incerta, até o ano de 2010, em âmbito nacional, que Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior, de forma habitual e em contexto de organização criminosa, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, abusaram do poder econômico, dominando o mercado de serviço de transporte rodoviário de veículos novos, eliminando total ou parcialmente a concorrência mediante o ajuste ou acordo de empresas, sendo que Aliberto Alves concorreu de qualquer forma para a conduta acima descrita”.

Mais adiante, os promotores do Gaeco afirmam, no documento, que “Consta, por fim, que entre data incerta, até o ano de 2010, em âmbito nacional, Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior, de forma habitual e em contexto de organização criminosa, em comunhão de esforços e unidade de desígnios, formaram acordo, ajuste ou aliança entre empresas prestadoras do serviço de transporte rodoviário de veículos novos, entre si e também com o Sindican – Sindicato Nacional dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Veículos e Pequenas e Microempresas de Transporte Rodoviário de Veículos (sindicato dos ‘cegonheiros’),visando à fixação artificial de preços dos fretes praticados em território nacional, impondo valor muito superior ao praticado pelas empresas concorrentes, e que seria a média vigente caso houvesse livre concorrência no setor e ao controle regionalizado do mercado pelo grupo de empresas associadas à ANTV, em detrimento da livre concorrência, não permitindo o ingresso de novos associados e negociando as "vagas" de transportador rodoviário de veículos existentes a preços exorbitantes, criando barreiras artificiais à entrada de novos concorrentes, sendo que Aliberto Alves concorreu de qualquer forma para a conduta acima descrita”.

Da quadrilha –Segundo a peça acusatória, “Aliberto Alves figurou como Presidente do ‘Sindican’ - Sindicato Nacional dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Veículos e Pequenas e Microempresas de Transporte Rodoviário de Veículos; exerceu as funções de Presidente do ‘Sindican’ durante a década de 1990, sendo os períodos mais recentes, de 27/06/1996 a 09/01/1999, de 10/01/1999 a 10/01/2002, tendo sido reeleito para o mandato de mais dois anos, como se extrai da Ata da ‘Assembléia Geral Nacional dos Cegonheiros’ de 26/06/1996 que aprova a constituição do ‘Sindican’ e das atas de posse da Diretoria e demais documentos constantes dos autos.

Vitorio Medioli figurou como sócio-proprietário da empresa ‘Sada Transportes e Armazenagens LTDA’ entre abril de 1998 até o ano de 2008, também exerceu a função de Diretor Presidente da ‘ANTV’ – Associação Nacional dos Transportadores de Veículos - entre março de 2002, até março de 2004 e demais documentos constantes dos autos.
 
Mário Sérgio Moreira Franco figurou como sócio-proprietário da empresa ‘Transportadora Sinimbu Ltda’ entre abril de 1998 até o ano de 2008.

Fernando Luiz Schettino Moreira figurou como sócio-proprietário da empresa “Transportadora Sinimbu Ltda” entre abril de 1998 até o ano de 2008.

Evandro Luiz Coser figurou como representante legal e procurador da empresa ‘Adb Holdings Ltda’ entre abril de 1998 até o ano de 2008. Segundo consta da resposta da acusação à denúncia anulada, a defesa informou que Evandro foi admitido como representante da ‘Cia. Importadora e Exportadora Coimex’ em 1998; nomeado como Diretor-Geral em 2001; ingressou na sociedade em 2003; permaneceu como sócio em 2004 com participação mantida em $1,00; em 2005, assina pela empresa na condição de sócio e diretor presidente, com participação de $1,00; permaneceu como sócio e diretor presidente em 2008, mantida a participação na sociedade à $1,00 (fls. 1.306/1307).

Orlando Machado Júnior figurou como representante legal e procurador da empresa ‘Adb Holdings Ltda’ entre abril de 1998 até o ano de 2008. Segundo consta da resposta da acusação à denúncia anulada, a defesa alegou que Orlando foi admitido como diretor-geral e assinou pela ‘Cia. Importadora e Exportadora Coimex’ em 1998; em 2002, permaneceu como diretor-gerente da sociedade; em 2003, foi eleito e reeleito para administrador e diretor, assinando pela ‘Coimex’; foi eleito para ocupar o cargo de diretor financeiro em 2005; permaneceu na condição de administrador e representante da ‘Coimex’ em 2008, assinando pela empresa.

Gilberto dos Santos Portugal figurou como Gerente-Geral da ‘Brazul Transporte De Veículos Ltda’ e responsável pela administração da empresa Tnorte Transportadora Nordestina De Veículos Ltda. Exerceu atividades na empresa por 17 anos, segundo alegação da defesa à fls. 604/606.

Roberto Carlos Caboclo figurou como Diretor Operacional da empresa ‘Transzero Transportadora De Veículos Ltda’. Ainda, sustenta a defesa que Roberto foi representante do grupo ‘Sada’ (Fls. 44/45). 

Mário de Melo Galvão figurou como Diretor-Geral da ‘Brazul Transporte De Veículos Ltda’ e responsável pela administração da empresa ‘Dacunha Transportes S.A’.
 
Tito Livio Barroso Filho figurou como Diretor da empresa ‘Tegma Gestão Logística Ltda’ entre abril de 2005 e dezembro de 2006.
 
Gennaro Oddone figurou como Diretor Superintendente da empresa ‘Tegma Gestão Logística Ltda’.
 
Édson Luiz Pereira figurou, entre agosto de 2003 até agosto de 2004, como Diretor Presidente da ‘ANTV’ e Diretor Comercial da ‘Sada Transportes Ltda’. Em resposta, a defesa informou que Édson foi Presidente da ‘ANTV’ entre os anos de 1998 até 2000 e 2003 até 2004 (fls. 3123 verso). Segundo o art. 29, §19, do Estatuto da ANTV, o Presidente do Conselho Superior é também o Presidente da Diretoria Executiva, cabendo à Diretoria Executiva a administração da Associação, na forma do art. 34 do citado estatuto (doc. 10, anexo 02, fls. 158/233).Na esteira dos últimos atos da ANTV registrados em Cartório, em especial as Atas de Reuniões Ordinárias e/ou Extraordinárias, vê- se que Édson apresentou-se em todas na condição de representante da reportada empresa, firmando subscrição quanto ao teor do que fora decidido em cada uma delas (fls. 1546/1564, anexo 01, volume VI e docs. Nº 05, 06 e 08, anexo 02, já referidos).

Luiz Salvador Ferrari figurou como diretor presidente da ‘ANTV’ desde setembro de 2004. logrou-se demonstrar a existência de uma sofisticada organização voltada à prática delitiva, dotada de evidente animus associativo, que se estruturou profissionalmente para a prática de crimes contra a ordem econômica.

Modus operandi –  Com efeito, o modus operandi adotado pela quadrilha formada por Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior,  consistiu na formação de um grupo de empresas, todas filiadas à ANTV, associação esta que, a despeito da sua pretensa "extinção", não aceita novos sócios exatamente para manter o monopólio/cartel do mercado de transporte rodoviário de veículos novos sob o domínio destas empresas, em sintonia com os interesses dos filiados ao Sindican, na pessoa de seu Presidente Aliberto Alves.

Desse acordo entre empresas e entre sindicato, por meio da atuação convergente entre ANTV e Sindican, decorre um rígido controle sobre o mercado de transporte de veículos zero km em âmbito nacional, inclusive sobre algumas montadoras, impedindo o acesso de novos transportadores ao serviço correspondente, acarretando, por conseguinte, considerável prejuízo para os consumidores finais dos automóveis.

Nessa perspectiva, pois, considerando o lapso de tempo transcorrido, verifica-se que os acusados Aliberto Alves, Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior, vêm, há muito, engendrando ações que se destinam à dominação do mercado de serviço de transporte, rodoviário de veículos novos, eliminando total ou parcialmente a concorrência, sob as condutas de ajuste ou acordo de empresas e, ainda, à formação de acordo, convênio, ajuste ou aliança entre os ofertantes, visando à fixação artificial de preços e ao controle regionalizado do mercado por empresa ou grupo de empresas.

De fato, pelo longo período em que se perpetraram as condutas delitivas, resta manifesto o vínculo associativo permanente estabelecido entre os acusados, porquanto formada complexa rede de atuações visando ao domínio do mercado referente ao frete de veículos novos até as concessionárias em âmbito nacional, o que afasta, de plano, a eventual suposição de mera reunião ocasional de condutas.

Cumpre salientar, ainda, que o denunciado Aliberto Alves, juntamente com outros acusados na Ação Penal n° 2003.71.00.00007397-5, foi condenado em 1a Instância pela prática de delitos contra a Ordem Econômica, o que, por si só, já demonstra a estabilidade da conduta voltada para a prática desta espécie delitiva.

Portanto, conclusão inarredável é a de que a associação criminosa se desenvolve em caráter estável, formada com o fim precípuo de praticar um número elevado de crimes contra a ordem econômica, erigindo-se em uma verdadeira "societas delinquendi".

A realização de acordo, ajuste ou aliança entre os denunciados apresenta-se como essencial para que os objetivos de dominação do mercado e eliminação da livre concorrência sejam atingidos, sendo necessária e fundamental a participação de cada um dos acusados Aliberto Alves, Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior,,na qualidade de sócios, presidentes, diretores ou representantes das referidas pessoas jurídicas, para a consumação dos delitos ora descritos.

Diante do acima exposto, resta consumado o crime autônomo do art. 288 do Código Penal, eis que há associação organizada, e não meramente ocasional, presente o animus associativo por parte dos denunciados, não se confundindo com o simples concurso de agentes.

Abuso do poder econômico – Para os promotores do Gaeco, a violação ao artigo quarto, I, da lei 8.317/90 está claro, comprovado o abuso do poder econômico. “Segundo consta dos autos, Vitorio Medioli, Édson Luiz Pereira, Luiz Salvador Ferrari, Gilberto dos Santos Portugal, Roberto Carlos Caboclo, Mário de Melo Galvão, Tito Lívio Barroso Filho, Gennaro Oddone, Mário Sérgio Moreira Franco, Fernando Luiz Schettino Moreira, Evandro Luiz Coser e Orlando Machado Júnior, na qualidade de sócios, presidentes e/ou representantes das empresas nos termos acima mencionados, abusaram do poder econômico, dominando o mercado, ou eliminando, total ou parcialmente, a concorrência mediante qualquer forma de ajuste ou acordo de empresas, sendo que  Aliberto Alves, na qualidade de presidente do Sindican concorreu, de qualquer forma, para a conduta acima mencionada.
 
Conforme apurado no decorrer das investigações, a ANTV - Associação Nacional dos Transportadores de Veículos - é instituição que atua em âmbito nacional, sendo composta, basicamente, por dois grandes grupos: Sada, o qual, por sua vez, detém dominação sobre as empresas Transzero, Dacunha, Tnorte e Brazul, e Tegma, a qual é composta pelas empresas Transportadora Sinimbu LTDA. e ADB Holdings LTDA., além das empresas Transauto Transporte Especializado de Automóveis LTDA. e CTV – Cooperativa dos Transportadores de Veículos e Cargas em Geral (O Gaeco não tinha ainda a informação sobre a compra da CTV pela Tegma), que não fazem parte de nenhum dos dois grupos mencionados, consoante se infere dos últimos atos registrados desta associação (fls. 1561/1564, anexo 01, volume VI).

ANTV constitui-se, na verdade, em um consórcio de empresas que mantém atuação coordenada e dirigida à manutenção do domínio do mercado de transporte rodoviário de veículos novos, impedindo o exercício da livre concorrência, da livre iniciativa e do ingresso de novos transportadores no mercado, detendo a quase totalidade desse ramo de transporte, criando barreiras à salutar concorrência que deve existir em qualquer mercado.

Evidente, pois, a dominação do mercado de veículos novos e a eliminação, total ou parcial da concorrência. Nesse sentido, inúmeras declarações nos autos demonstram o prejuízo à concorrência, valor garantido constitucionalmente.

Nessa perspectiva, nada obstante o teor da Ata inserta à fls. 1561/1564, anexo 01, volume VI, a apontar uma suposta "extinção" da ANTV, o fato é que a atuação coordenada das empresas que participaram de tal reunião continua em plena atividade, mantendo, os Grupos Sada e Tegma, o comando das ações que se desenvolvem no desiderato da manutenção da cartelização do transporte rodoviário de veículos novos em nosso país”

Ante o exposto, concluem os promotores, “denunciamos:

Vitorio Medioli
Édson Luiz Pereira
Luiz Salvador Ferrari
Gilberto dos Santos Portugal
Roberto Carlos Caboclo
Mário de Melo Galvão
Tito Lívio Barroso Filho
Gennaro Oddone
Mário Sérgio Moreira Franco
Fernando Luiz Schettino  Moreira
Evandro Luiz Coser
Orlando Machado Júnior
Aliberto Alves,

como incursos nos artigos 288 do Código Penal, artigo 4º, I e artigo 4º, II alíneas ‘a’ e ‘b’, c/c art. 12, I, todos da Lei nº 8.137/90, na forma do artigo 29, observada a regra do artigo 69, todos do mesmo diploma legal.

Requer o Ministério Público do Estado de São Paulo, após o recebimento da presente denúncia, a citação e intimação dos acusados para apresentarem resposta escrita, no prazo legal, com posterior intimação e oitiva das testemunhas a seguir arroladas, prosseguindo a ação penal até a final sentença condenatória”.

                        São Bernardo do Campo, 23 de julho de 2013.