Sineimar Reis*

 

  O futebol é um dos esportes mais populares do mundo. De acordo com pesquisas, até hoje não se tem um dado concreto de quando e onde surgiu o futebol, mas o que se sabe é que em muitas culturas os povos já faziam algo parecido com o futebol, ou seja, brincadeiras de chutar bolas, mas sem regras, e sem limites. Pode-se afirmar que o futebol chegou na América, e continente Europeu ou em várias regiões do mundo, por volta de século XIX através dos imigrantes ingleses que estavam a procura do novo mundo, e estendendo seus afazeres dentro da colônias formadas por seus habitantes, em escolas, empresas, alguns clubes e grupos da elite local. Foi no século XX, na Inglaterra, que o futebol passou a ser um jogo oficial, já com algumas regras, e o principal objetivo do jogo é chutar a bola e colocar ela dentro do gol. A prática deste esporte foi integrada em um conjunto de novas experiências de sociabilidade, onde o tempo livre recebeu uma determinada utilidade. Os executores deste movimento foram as crianças, jovens imigrantes e dos setores populares urbanos, ocupados a transferir a paixão pela identidade territorial e o esporte foi se tornando numa fundação de clubes-equipes etc. (Frydenberg 1996, 1997).

 

  Em muitas regiões, o futebol foi conhecido como um cenário ideal para canalizar fervor e entusiasmo na juventude para consolidar um futebol divertido, para ganhar espaço na sociedade e admitir grupos de imigrantes em novos espaços de socialização. É assim que muitas associações esportivas das primeiras décadas do século XX se prevaleceram. As fontes indicam que grandes nomes do futebol tanto na América quanto na Europa se compartilharam a paixão pelo futebol e praticando-o nas ruas, margens de rios, e em outros locais como praças, praias etc. os jovens, seguiram a moda juvenil da época, levando a encontrar uma equipe de futebol para possuir a possibilidade de participar de torneios e ligas independentes. Já alterando o assunto, o objetivo perseguido pelas associações esportivas que não era lucrativa, mas estritamente social e recreativa, e sua intenção foi identificar-se em torno de um território local, de vizinhança, de bloco ou de canto, marcando também um sentimento de presença aos locais de eventos futebolísticos nos países, onde o sentimento e a razão de defesa dos próprios espaços, por esta razão que alguns clubes que foram fundados no início do século XX, aparecem ligados ao nome de bairros, ou uma cidade suburbana. Na Argentina por exemplo é onde tem a maior concentração de times de futebol das Américas e em Buenos Aires, cada esquina tem um time, cidade com quase 3 milhões de habitantes, ao todo são 29 clubes profissionais, alguns deles quase que amadores, mas participantes de uma das divisões do Campeonato Argentino. O que muita gente confunde, inclusive até alguns meios de comunicação, é mencionar clubes da Região Metropolitana de Buenos Aires como sendo da capital. Não é raro escutar ou ler que “tal time irá a Buenos Aires para enfrentar o Banfield, Independiente ou Lanús”, por exemplo, sendo que esses são times de fora da Capital Federal. Em Buenos Aires, diferente de vários lugares, cada clube representa seu bairro de origem. Torcer por determinado time significa defender sua gente, sua região, suas raízes. E daí é que temos vários clássicos dentro de uma mesma cidade, pois enfrentar um time de um bairro vizinho não envolve só futebol. Um exemplo é o clássico entre San Lorenzo e Huracán. Embora o campeão da Libertadores seja um dos grandes do futebol argentino, vencer seu vizinho regional às vezes vale mais do que bater Boca ou River.

  De acordo com Frydenberg 2001, os clubes de vizinhança surgiram para cobrir as insuficiências do estado e gerar espaços de sociabilidade, cultura e esportes, tentando defender os direitos e garantir o bem-estar do indivíduo, ajudando seu desenvolvimento pessoal e fornecendo serviços que acompanharão sua identidade. Esta tradição de práticas e mentalidades associativas já foi promovida a partir da sociedade civil e começou a cristalizar na década de 1930, seguindo o modelo de funcionamento das sociedades de desenvolvimento dos bairros e locais principais dos times, bibliotecas populares, sindicatos e corporações empresariais, de onde exerciam virtudes cívicas, treinando na vida social e democrática. No início do século XX, quando a prática do futebol começou a se espalhar entre os jovens dos setores populares, o movimento fundacional dos times que estavam no mesmo clubes esportivos do tempo começam a abrir mais e mais à comunidade, dependendo do número de membros registrados para o seu crescimento.

  Sampa afirma que o futebol não tenha se concentrado no pensamento e na organização econômica por um longo tempo, com o advento da globalização e a aplicação das políticas neoliberais durante a décadas, essa realidade foi modificada, consolidando um novo paradigma. Esta etapa do futebol resultou na execução de um drástico programa de reformas estruturais no funcionamento das instituições públicas, justificando sua privatização total ou parcial de desmantelamento e marcação como boa. Isso, tem acompanhado e facilitado pela instalação de um novo modelo de dominação política, produzindo uma forte reconfiguração de toda a sociedade. Com o passar dos anos, o avanço destas novas políticas modernas de gestão no futebol, os modos de organização das instituições de esportes administradas desde suas origens por seus dirigentes, foram modificados de acordo com a implementação de uma lógica de negócios. Além do mercado sempre existiu no futebol, desde o início de sua era profissional, o novo quadro político-econômico dos anos noventa, assim lançaram as bases que permitiram um processo acelerado de modernização no esporte. Assim ocorreu uma dinâmica que legitima a aplicação dos recursos atuais, atual e inovador, em algumas áreas na comercialização do futebol. Este uso de Técnicas e estratégias no campo do futebol podem ser chamadas de "mercantilização", ou “mercado da bola” no sentido da implementação ordenada, acelerada e sistemática de medidas de mercado contemporâneo, o processo de mercantilização marca um antes e depois, determinado por um desejo crescente de ganhar dinheiro, sob novas regras no esporte.

 

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1 Seguindo a teoria social de autores como Manuel Castells (1999), Maristella Sampa (2005), Emir Sader (2008) e Boaventura de Sousa Santos (2007), existem várias categorias para conceber uma sociedade em tempos de globalização: "sociedade de rede", "sistema mundial", "modernidade avançada" entre outras. Além das diferenças teóricas dessas denominações, a maioria dos autores coincidem em apontar que, nesse período, as transformações foram aprofundadas e as diferenças entre o precedente e a época atual. Por "globalização" entende-se a entrada para um novo tipo social, separando-se dos quadros regulatórios coletivos desenvolvidos na era “fordista”, nesse sentido, os padrões de inclusão e exclusão social foram modificados, refletidos no aumento das desigualdades e nos processos de fragmentação.

  No entanto, apesar das intenções privatizantes deste novo modo de organização e renovação, as organizações desportivas dificilmente permanecem alienadas ou rejeitadas. O problema dos clubes de futebol, se agrava durante a crise econômica e financeira do passado (para manter o modelo neoliberal), assim promoveu a implementação de ideias e estratégias para tornar sua administração mais "efetiva e eficiente", afastando-se do modelo "tradicional", vinculado ao discurso de atraso econômico. Além disso, com a implementação dessas políticas, uma reconfiguração em relação ao indivíduo e sociedade, propondo novos modelos como cidadão-consumidor. Outro aspecto relacionado a esta ideologia foi a chegada e a incorporação de líderes do mundo empresarial, que se apresentou a clubes esportivos políticas diversas ligadas ao marketing e ao mundo dos negócios. No âmbito deste processo, a medida que for aprofundar, a ideia de privatização de clubes esportivos surge, com tentativas para convertê-los em sociedades anônimas.

 

                                                                     De acordo com Cruz, através do 

                                                                     desempenho de esses diretores, as 

                                                                     sociedades esportivas foram 

                                                                     estabelecidas como empresas prescritas 

                                                                     por lógica e eficiência da concorrência.

 

  O modelo que pretendia seguir estava ancorado na Europa. Desde o século XIX, os clubes esportivos da Inglaterra já eram taxados como uma empresa e cada instituição era administrada por membros da mesma família, mas esta operação começou a mudar quando gradualmente, nos idos dos anos sessenta, diretores e dirigentes assalariados apareceram no auge do negócio, priorizando o mercado competitivo. CRUZ, 2005. P, 79 e 80.

  Proni (2000) afirma que a experiência da Itália na organização de empresas de futebol, tem trabalhado como modelo para outros países da Europa. Em março de 1981, a legislação italiana de esportes profissionais deu liberdade aos clubes de futebol para se tornarem empresas comerciais, pertencente a grupos econômicos privados. Em troca disso, uma comissão de supervisão de estado exercerá forte controle sobre a administração e auditoria dos balanços das instituições. Debatendo à ideia de que a transferência do patrimônio dos clubes para empresas privadas reorganizaria as finanças e moralizaria a gestão nas entidades de esportes que eram e são suspeitas de corrupção e tem laços com mafiosos. O processo de intervenção governamental e controle público do futebol, o profissional tem peculiaridades e cronologias de acordo com cada país na Europa, assim o autor afirma que foi na década de noventa que a iniciativas de legislação específica para o futebol obrigaram os clubes a se transformarem em sociedades de esporte comercial ou para apresentar periodicamente suas contas aos órgãos de controle, embora enquanto na Espanha foi imposto um sistema opcional que contempla a continuidade do associações desportivas sem fins lucrativos fortemente controladas pelo Estado como Real Madrid, FC Barcelona e Atlético de Bilbao e a formação de sociedades anônimas de esportes (SAD). Na Itália, os clubes escolheram o modelo Football S.A.

  Os motivos que levaram os países da Europa a adotar o modelo da sociedade de esportes anônimos não diferem muito do que acontece hoje na América Latina. Clubes que passaram por fortes crises financeiras foram a cargo de necessidade para financiamento, levando a vontade de criar empresas viáveis ao mercado global do futebol, isso foi o que provocou a mudança no modelo de mercado.

  Desta forma, o processo de modernização nascido na Europa configurou um largo espaço regimental: renda em marketing esportivo, teorias empresariais, instalação de clube como marca, crescimento de empresas patrocinadoras, venda de produtos e a remodelação dos estádios para transformá-los em centros de conferências e passeios turísticos. Enquanto o clube (ou a empresa) realizasse negócios frutíferos e bem-sucedidos, seria grande a credibilidade, assim aumentaria o número de seguidores, consumidores e/ou parceiros (as) e usaria uma marca (planejado por especialistas em marketing) para apoiar a linha de produtos, aumentar o consumo e gerar novos lucros. Apoiar este discurso de modernização da gestão e comercialização das entidades futebolísticas, estima-se que os clubes esportivos seguem esses padrões de gestão empresarial, liderada pelo departamento profissional, alcançando resultados econômicos que implica com situações de crescimento em todas as áreas das instituições, aumentando-se como marcas dentro do mercado. Vale ressaltar que o futebol mundial é hoje um grande negócio. De acordo com o relatório final do Plano de Modernização do Futebol Brasileiro (2000) da Fundação Getúlio Vargas2 (FGV), que inclui os agentes diretos, como clubes e federações, e indiretos, como indústrias de equipamentos esportivos e a mídia, o futebol mundial movimenta, em média, cerca de 250 bilhões de dólares anuais.

  Neste enfoque, as variáveis políticas tanto internas à indústria de futebol, como à estrutura do poder nas organizações esportivas, quanto externas, como as relações destas com o ambiente social e institucional, não são analisadas. Contudo, são variáveis importantes para explicar como surge a necessidade de mudança e de profissionalização dos dirigentes de clubes e federações de futebol. Por exemplo, com recorrência, várias questões relacionadas com tais variáveis são elevadas à condição de destaque como tema de interesse público estampado na imprensa escrita e falada. Dentre elas, o descaso com o cliente-torcedor caracterizado pela violência nos estádios, o excesso de negociações dos melhores jogadores para a Europa, em que o interesse de alguns prevalece sobre o interesse de muitos, às vezes por vias ilegais, as manobras políticas de dirigentes de federações mudando regras de acesso e descenso entre divisões dos campeonatos nacionais de futebol, etc. Todas essas ações representam políticas administrativas ou posicionamentos estratégicos tidos como equivocados e que, ao mesmo tempo, dificultam a mudança de comando no poder de clubes e federações e desvalorizam o potencial de geração de renda dessa indústria. LEOCINI, 2005. p,13.

  A estrutura e a lógica do negócio futebol representam o pano de fundo micro-econômico para a atuação dos clubes de futebol e são condicionantes estruturais diferenciadas e mais complexas do que a de outros setores econômicos mais tradicionais. Por exemplo, a caracterização da cadeia de produção da indústria de futebol, com seus vários agentes interdependentes e com interesses muitas vezes conflitantes, representa uma das principais condicionantes dessa indústria. Se, por um lado, os torcedores ou o mercado de torcedores gostariam que alguns jogadores permanecessem no “seu” clube por bastante tempo, por outro, empresários de jogadores lucrariam mais a curto prazo com a transferência deste mesmo jogador para outro clube. Assim, o estabelecimento de políticas e diretrizes a longo prazo dentro da indústria estará sempre condicionado por tais características. Outro aspecto importante deste cenário é a importância do âmbito cooperativo dos clubes de futebol.

 

                                                                                           CONCLUSÃO

 

  O resultado deste trabalho nos permite uma visão mais clara do negócio futebol como um sistema de produção de renda para os clubes, apesar das poucas informações esclarecedoras sobre o funcionamento das operações de negócio, além disso, permite que se perceba as principais condicionantes estratégicas da indústria de futebol que influenciam a concepção do modelo de gestão de um clube de futebol atualmente.

 

                                                                               REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

CRUZ, A. (2005) A nova economia do futebol. Uma análise do processo de modernização de alguns estádios brasileiros. UFRJ/PPGAS. Museu Nacional. Rio de Janeiro.

 

LEOCINI, Márvio Pereira. Entendendo o futebol. 2004. São Paulo.

 

FRYDENBERG, J. D. 1996 “Novos estudos em torno da história do futebol”, publicado originariamente na Revista Digital de Educação Física e Esportes, Vol. nº 1, Buenos Aires.

 

PRIMEIRO CONGRESSO INTERNACIONAL EAESP DE GESTÃO DE ESPORTES. São Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 1998.

 

PRONI, M. W. & Zaia, F. H. (2007) “Gestão empresarial do futebol no mundo globalizado” em Ribeiro, L. (Ed.) Futebol e globalização, Jundiaí, SP: Fontoura.

 

PRONI, M. W. 2000 A metamorfose do futebol, Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, San Pablo, Buenos Aires.

 

SAMPA, M. 2005 a sociedade excluída: A Argentina e o neoliberalismo, Buenos Aires: Taurus.  

 

 

 

*Possui graduação em História pela Instituição Educacional Cecilia Maria de Melo Barcelos Faculdade Asa de Brumadinho, Minas Gerais, (2012). Graduado licenciado em Artes Visuais pela Faculdade de Nanuque, Minas Gerais, (FANAN) 2015. Cursa Mestrado em Políticas Públicas e Urbanização no Brasil e na América Latina pela Faculdade Latino Americana (FLACSO-BRASIL). Tem experiência na área de História com ênfase nos seguintes temas: Ciência política e políticas públicas sociais e educacionais, história contemporânea e política brasileira e do tempo presente. Arte contemporânea em relação ao público escolar, arte pública e poder público. Aborda principalmente os seguintes temas: História social da cultura, políticas públicas governamentais e educacionais, arte no espaço urbano e espaço arte. Músico tocador de flauta transversal e artista especialista em desenhos realistas. Tem vasta experiência com ensino fundamental e médio. Atua como professor da rede Estadual de ensino nas disciplinas de história e arte, atualmente leciona arte em duas escolas da rede pública na cidade de Betim e Contagem/MG na modalidade Fundamental e Médio. No dia-a-dia direciona o Instituto do Patrimônio Histórico da Cidade de Betim. Coordena e participa de grupos de pesquisa e seminários em estudos voltados para as políticas públicas desenvolvendo projetos sociais junto ao movimento dos trabalhadores que contribui com o processo de reforma agrária e por uma sociedade mais justa.

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