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*Por Bruno Oliveira Maggi Embora seja uma realidade tanto nos Estados Unidos quanto na União Europeia – mesmo que mais recente no caso da última –, as ações indenizatórias buscando o ressarcimento por danos decorrentes de cartel sempre foram objeto de pouca atenção no Brasil. O cenário, no entanto, tem mudado nos últimos anos e recentes decisões indicam o robustecimento da prática no país. Seja por meio do incentivo ao uso de instrumentos de justiça negociada, com os chamados Acordos de Leniência e Termos de Cessação de Conduta (TCC); seja por meio dos investimentos em estrutura física e humana da Autarquia; fato é que o CADE passou de um modesto corredor alocado no prédio do Ministério da Justiça para se tornar um ator público relevante na tomada de decisões dos empresários brasileiros. O resultado de tais medidas foi a melhoria do nível das decisões, com provas mais robustas e redução da incerteza quanto ao envolvimento dos condenados nas infrações anticompetitivas, e também o aumento das multas impostas pela Autarquia, em especial para punir a prática de cartéis. Mas a imposição de pesadas multas às empresas não garante o ressarcimento do prejuízo aos prejudicados, uma vez que a sua função não é ressarcitória. Esse papel é cumprido pelas denominadas ARDC´s (Ações de Reparação por Danos Concorrenciais), que permitem o ressarcimento às pessoas físicas e jurídicas que, por exemplo, adquiram os produtos com o preço artificialmente inflado, seja de maneira direta ou indireta pelo cartel. Sem o pagamento da devida indenização aos prejudicados, o cartel continua sendo um bom negócio, posto que mesmo com a aplicação de multas, a manutenção de vultuosas parcelas de dinheiro com os praticantes do cartel, favorecendo ainda mais a ideia de que o cartel seja um crime que compensa. Por isso que as Ações de Reparação por Danos Concorrenciais possuem interessante função dissuasória contra a prática de cartéis, se não fundamental – não no sentido de exclusão ou diminuição da importância das punições criminal e administrativa, mas no sentido elemento complementar essencial. A cobrança das indenizações é altamente efetiva no combate aos cartéis, pois geralmente os valores são muito mais elevados que as multas pagas e não há como se estimar, antes da formação do cartel, qual será o valor pago no momento da eventual condenação dos infratores. Em realidade, se viabilizada a plena indenização dos prejudicados, mesmo que apenas dos danos materiais emergentes, torna-se impossível que o saldo do cartel seja positivo. Assim, ou os cartelistas terão trabalhado em vão, sem lucrar nada, ou terão prejuízo, pois além de devolverem tudo o que obtiveram ilegalmente, ainda pagarão pelo custo de operação do cartel e eventuais multas ou demais danos (lucros cessantes ou imateriais). Para que seja calculado o valor da indenização devida pelos prejuízos gerados pelo cartel, primeiro é necessário isolar cada uma das lesões geradas e calcular os prejuízos aferidos pelos compradores. Além do sobrepreço cobrado pelo cartel, que corresponde a um prejuízo controlado, na medida em que o valor recebido pelo fornecedor é o mesmo que é pago pelo comprador direto, tem-se a restrição ao desenvolvimento natural do mercado e a diminuição geral do bem-estar social. Esses dois últimos prejuízos são de difícil avaliação, mesmo depois do encerramento das atividades do cartel, pois não guardam correspondência com os ganhos obtidos pelos infratores. O que se pode analisar da crescente iniciativa de pedidos de indenização é que o primeiro e principal dos pontos sobre os quais os tribunais brasileiros terão que se debruçar para definir o rumo da efetivação de tal tipo de ação no país é a discussão sobre a prescrição. A discussão do tema é muito controversa porque os cartéis são, por definição, acordos secretos (além de ilícitos) e, portanto, não há como saber da sua existência até que seja descoberto pelas autoridades. Em geral, no mundo todo, os cartéis costumam ser descobertos apenas cerca de 5 anos após o encerramento de suas operações. Portanto, não há qualquer lógica que a contagem do prazo prescricional se inicie na data da ocorrência do fato, o seja, quando o cartelista cobrou do comprador mais do que deveria pelo seu produto. De fato, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), órgão que concentra cerca de 70% das ações atualmente existentes sobre o tema no Brasil, se posicionou recentemente sobre o tema da prescrição para o Cartel do Cimento (confirmando outra decisão já proferida anteriormente no mesmo sentido sobre o investigado Cartel dos Gases Industriais) e determinou que a contagem do prazo ocorre a partir da publicação da decisão final do CADE. Esse é o momento em que ocorre a ciência aos prejudicados da existência do cartel e de seus participantes, bem como tal posicionamento confirma a aplicação da teoria da actio nata, já amplamente aceita pelos tribunais superiores. Nesse sentido, confirmando-se tal posicionamento pelos demais Tribunais do país – e até mesmo o do próprio TJSP, posto ainda estar pendente julgamento de um Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) sobre o mesmo tema – ter-se-á dado um grande passo na direção de assegurar o direto aos consumidores e demais prejudicados da sociedade brasileira para buscarem a indenização por seus prejuízos. Resta agora apenas aguardar que os consumidores (e todos os demais prejudicados) busquem cada vez mais garantir seus direitos e exijam a reparação pelos prejuízos que sorrateiramente lhe são constantemente impostos. Bruno Oliveira Maggi é advogado, especialista em Direito Concorrencial, e autor da obra Cartel - Responsabilidade Civil e Concorrencial.
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